Seis filmes e uma vida

1936-2010


por Nuno Castro
31.5. 2010

Vida e obra de Dennis Hopper andaram sempre lado a lado.
As personagens de seis décadas a representar

"Já devia ter morrido dez vezes. Reflecti muito sobre isto. É um milagre ainda estar vivo."

A frase é de Dennis Hopper e foi dita numa das suas últimas entrevistas.

No entanto, o actor não se referia ao cancro na próstata que lhe foi diagnosticado em setembro de 2009 (a causa da sua morte, na manhã de sábado, há dois dias). Hopper falava da vida de excessos do "guru da contracultura enlouquecido pela droga", como lhe chamou o escritor Peter Biskind no livro "Easy Riders, Raging Bulls: How the Sex-Drugs-and-Rock 'n' Roll Generation Saved Hollywood", que revela os hábitos pouco saudáveis do actor nos anos 60 e 70: três gramas de cocaína por dia, 30 cervejas, alguma marijuana e muitas cubas libres.

Vida e obra andaram quase sempre lado a lado nas quase seis décadas que Hopper dedicou ao cinema. A linha que separa as suas interpretações da realidade fora do ecrã parece por vezes demasiado ténue. Recordamos seis momentos marcantes da sua carreira. E vida.

Anos 50: "Rebel Without a Cause" Um papel menor, em 1955, que marcou a estreia de Dennis Hopper no cinema, ao lado de James Dean, o ídolo de quem se tornaria amigo. Nas filmagens, o jovem actor foi fotografado a ler o escritor russo Constatin Stanislavski. Uma reportagem de 1959 refere Hopper como um miúdo de 23 anos em início de carreira que se "levanta às dez da manhã, lê Nietzsche, visita galerias de arte, frequenta livrarias e vê filmes estrangeiros".

Anos 60: "Easy Rider" O seu maior legado para o cinema americano. Dennis Hopper é a personagem central da lenda "Easy Rider": realizou, montou e interpretou. Nessa época já de consumo de drogas, o seu temperamento irascível fazia estragos e houve vários choques com o co-autor Peter Fonda. O filme custou 335 mil euros e rendeu 17 milhões de euros.

Anos 70: "Apocalypse Now" Dennis Hopper é um inesquecível repórter fotográfico que enrola a língua a falar, sujo, despenteado e totalmente louco. Qualquer semelhança com a realidade não é pura coincidência. Nessa fase Hopper estava completamente afundado em drogas e álcool. Um programa de reabilitação em 1983 terá curado o actor.

Anos 80: "Veludo Azul - Blue Velvet" O filme-referência nos papéis de vilão que se seguiram. Mais uma vez, não há coincidências. Quem o garantiu foi o próprio Hopper, numa entrevista que deu posteriormente confessando o pedido ao realizador David Lynch: "Tens de me deixar fazer de Frank Booth [vilão do filme] porque eu sou Frank Booth."

Anos 90: "Speed - Alta Velocidade" Ao lado de Sandra Bullock e Keanu Reeves, é um Dennis Hopper reabilitado e rendido à era dos blockbusters que aparece nos cinemas em 1994. Mesmo assim, a imagem de marca persiste: é o vilão, desta vez um bombista louco e ressentido.

Anos 00: "Elegia" Baseado num romance de Philip Roth, é um dos últimos filmes em que participa. O actor interpreta o papel de um artista nova-iorquino, remetendo-nos para a faceta artística de Hopper, que foi pintor, escultor e um visionário coleccionador de arte que no início de carreira de Andy Warhol lhe comprou dois quadros por 60 euros.

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