Querida Julieta


Amor

por Diana Garrido
16.06 2010


O Clube Julieta, em Verona, Itália, dedica-se a responder as milhares de cartas enviadas todos os anos à personagem de Shakespeare

Julieta Capuleto morreu por amor. Um beijo envenenado ao seu Romeu e o casal mais apaixonado da história do teatro desaparece, deixando uma dor nos espectadores que, por algum milagre, esperam sempre que daquela vez, só daquela, o desfecho que Shakespeare escreveu há 415 anos seja diferente.

Nem Baz Luhrmann, com a sua versão cinematográfica moderna, de 96, com Leonardo DiCaprio e Claire Danes como casal romântico, lhe alterou o final. Pistolas sim, final feliz é que não.

Em Verona, Itália, local onde todo o drama se passa, há um clube especial. Chama-se Clube Julieta e foi fundado nos anos 70 por Giulio Tamassia, como associação cultural e grupo de amigos.

O objetivo era promover tertúlias, concertos e exposições ligadas a Verona e a Romeu e Julieta. No entanto, em 89, o clube assumiu outras funções: responder às centenas de cartas dirigidas a Julieta enviadas de todo o mundo.

Estas cartas falavam de desgostos de amor, dúvidas românticas, sobressaltos do coração que pediam o consolo das palavras sábias da personagem de Shakespeare.

Foi o guardião do túmulo (a fingir) de Julieta, no final dos anos 30, que iniciou a tradição ao responder às missivas deixadas na tumba pelos visitantes. A coisa pegou e hoje o Clube Julieta conta com 15 voluntários que acalmam sobressaltos do coração de estranhos.

Giovanna Tamassia tem 45 anos e até há pouco tempo trabalhou como tradutora. Hoje dedica-se ao clube a tempo inteiro. Os voluntários, dois homens e 13 mulheres, têm idades entre os 20 e os 50 anos e ocupações tão diferentes como guias turísticos, professores, estudantes ou donas de casa.

As cartas, que chegam de todo o mundo, são "na maioria enviadas por mulheres", conta Giovanna. "São todas diferentes e contam histórias reais. A semana passada recebemos uma de uma mulher de 21 anos que está apaixonada por um oficial da marinha que está longe em missão. Ela descreve o amor deles como profundo, louco, rebelde. O problema é que está gravemente doente e resta-lhe pouco tempo de vida. Como sabe que ele não consegue viver sem ela, pede que Julieta reze por ele..."

Nem sempre é fácil responder às cartas. Giovanna recorda uma mulher polaca que conheceu um homem da Síria pela internet, pelo qual se apaixonou: "Chegaram a conhecer-se pessoalmente e ela queria ir viver com ele em Abu Dabi e pedia a Julieta que a aconselhasse. Não soube o que responder. Acabei eu também por pedir conselhos e escrevi-lhe que tivesse muito cuidado: e se ele tivesse outra mulher?"

Às vezes as histórias e relatos são tão sentidos e dramáticos que Giovanna não consegue evitar as lágrimas: "A história de um homem que tinha perdido o amor da sua vida, devido a alguns erros que tinha cometido no passado, comoveu-me. Estava preso, mas a forma como escreveu acerca da mulher que amava e tinha perdido era tão sentida e profunda que me fez chorar. Nestas alturas é difícil encontrar as palavras certas para confortar as pessoas."

Apesar de muitas cartas chegarem por email, há ainda muitos que preferem o método tradicional das cartas escritas à mão e enviadas pelo correio: é mais romântico.

Os voluntários do clube respondem a dez cartas por dia, entre todos. Para quem escrever a missiva mais bonita e romântica há o prémio anual "Querida Julieta". O vencedor é convidado a passar um fim-de-semana em Verona. Mas antes que se sente a escrever, munido de dicionário e poemas inspiradores, Giovanna avisa: "As cartas mais bonitas são sempre as espontâneas."