Erotismo e Arte


Almoço na relva
Almoço na relva causou grande escândalo quando foi exposto, em 1863. O público não apenas criticou a liberdade das pinceladas e a diluição das áreas cromáticas, como também considerou de mau gosto o nu feminino, que não era alegórico nem representava uma deusa clássica. Manet declarou que o verdadeiro tema do quadro era a luz e foi essa idéia que deu origem ao impressionismo.



Entrevista - Dian Hanson


por Joana Stichini Vilela
29.5.2010

Largou as revistas pornográficas para ir fazer os livros de arte erótica mais populares do mundo. "The Big Butt Book" acaba de sair

A primeira reacção é de espanto. A editora dos livros de arte erótica da editora alemã Taschen é uma mulher de 58 anos.

Durante quase três décadas,
Dian Hanson foi editora de revistas pornográficas e para fetichistas. Ao mesmo tempo viveu em pleno a era da libertação e experimentação sexual nos EUA.

Em 2001, ao fim de sete anos de insistência do fundador da milionária Taschen, aceitou o convite e assumiu o cargo de sexy book editor. "Sou uma pequena ditadora", avisa.

Não é difícil - faz quase tudo sozinha: pesquisa e escolha de imagens, entrevistas e edição de textos. Lançado na Europa este mês e nos EUA dia 1 de Junho, "The Big Butt Book" é o trabalho mais recente. Levou quatro anos a concluir. Resultado: 400 fotografias de grandes traseiros "icónicos". Palavra de editora.

Nunca se cansa de olhar para rabos e pénis?

[ri-se] Nunca, nunca, nunca. Ficaria cansada de olhar para os normais. Mas o prazer deste trabalho está em analisar milhares e milhares de fotografias até encontrar aquela a imagem extraordinária. Algumas são pura arte.

Onde está a fronteira entre arte e pornografia?

Na qualidade. Pode haver uma fotografia hard-core, que mostra actividade sexual explícita, mas que está tão bem encenada e iluminada que passa a ser arte.

Como encontra as fotografias?


Ligo a ssoas que conheço e que acho que podem ter coisas boas. Elas encaminham-me para outras. Pesquiso na internet, compro no eBay. É como se fosse uma caça ao tesouro. Depois passo horas e horas em arquivos. Para este livro tive de ver cerca de meio milhão de fotos.

E aprendeu muito?

Imenso. Por exemplo, na Alemanha medieval, durante as tempestades, as mulheres espetavam o rabo nu pela porta para assustar o diabo. Acreditava-se que o Diabo conseguia assumir todas as formas, menos a das nádegas humanas, e que humilhado pela visão de umas belas nádegas, viraria para longe o seu olhar diabólico.

E o que a surpreendeu mais?

Talvez a coisa mais horrorizante seja que agora as mulheres para terem estas nádegas grandes recebem injecções clandestinas de silicone. E há mulheres a morrer em guetos americanos e na América do sul. Tenho a certeza que estará a chegar à Europa.

As nádegas que se vêem no livro são todas naturais?

Quando percebi, evitei as artificiais. Porque não quero encorajar isto.

Como começou este fascínio pelo mundo da pornografia?

Muito cedo. Aos cinco anos, comecei a reparar no peito das mulheres, que nessa altura usavam sutiãs pontiagudos. Interrogava-me sobre o que estaria por baixo. Fazia desenhos. Sabia que este era um interesse errado e então rasgava-os e punha-os no lixo. Ao mesmo tempo, o meu pai andava nu em casa e eu tomava banho com a minha irmã e o meu irmão - o nosso lar era muito aberto nesse sentido. Por volta dos dez anos, descobrimos as revistas pornográficas do nosso pai. Fiquei fascinada. Queria crescer e parecer-me com aquelas mulheres com os seus grandes seios e ancas redondas.

Não a chocaram as revistas?

Não, não. No início da adolescência já tinha um apetite sexual muito elevado. Com 14 anos ia passear o cão à noite e os homens paravam de carro ao pé de mim. Eu deixava-os apalpar-me o peito até começar a sentir-me culpada. Aos 17 anos saí de casa. Os meus pais não conseguiam controlar-me. Então li o meu primeiro livro pornográfico.

O que era, lembra-se?

Claro. Tenho-o. Nesse ano, 1970, o governo tinha lançado um estudo científico sobre os efeitos da pornografia. A Greenleaf Classics, que fazia material pornográfico, editou o relatório na íntegra com ilustrações. Custou-me 30 dólares. Tinha tudo: gay, BDSM, bestialidade. Aprendi a masturbar-me com ele. Pouco antes de fazer 18 anos, conheci o meu primeiro marido, que achava que era transexual. Era outro hippie. Queríamos fazer pornografia.

E em que trabalhava nesta altura?

Era terapeuta respiratória em hospitais. Durante o dia tomava conta das pessoas, ressuscitava-as, era um grande anjo misericordioso. À noite tinha sexo promíscuo, ia a sex-shops, via filmes de sexo. Em 1976 conheci um homem que estava a começar uma revista pornográfica hardcore chamada "Puritan". Foi o meu bilhete para esta indústria fascinante.

Começou logo como editora?

Sim, essa foi uma das coisas maravilhosas desta indústria. Era descontraída e amadora. Nos anos 70 podíamos ser despedidos por gastar demasiado dinheiro a trazer raparigas de avião para sessões fotográficas ou a ir a clubes de sexo, mas conseguíamos sempre dinheiro para nos mantermos. Era a perspectiva hippie.

Como assim?

Depois de deixar a "Puritan", uma revista de hard-core pretensiosa, fiz equipa com um homem chamado Peter Wolf, que era outro hippie e que tinha inventado um género de revistas escritas pelos leitores. Implorávamos-lhes que nos mandarem fotos deles, coisas que tivessem escrito, para nos alertarem para actividades sexuais que estivessem a acontecer no país. Depois metia-me num avião e ia a estas pequenas cidades fazer sessões fotográficas de mães que faziam swing, empregadas de mesa nuas....

Nunca se sentiu a mais num mundo de homens?


Nunca senti que o meu interesse por sexo fosse o de uma mulher normal. Quando comecei, os homens estavam ansiosos por ter uma mulher. Achava que ia saber o que os homens gostam. Também tínhamos sempre as modelos por perto. Tornei-me uma figura maternal.


Para toda a gente?

Um pouco. Aprendi cedo que as mulheres são malvistas quando estão em posições de poder e que ser maternal é uma forma de exercerem o seu poder sem criarem ressentimentos. Uma mãe é muito poderosa, mas também é amada e respeitada.

Como é que entende tão bem os desejos dos homens?

Um: tive sexo com centenas de homens; dois: li milhares de cartas de homens que escreviam sobre a sua sexualidade. Eles não assumem isto às mulheres, mas estão desejosos de partilhar as suas vidas sexuais com uma mulher que dirige uma revista de sexo porque sentem que ela não os vai julgar.

Nunca os julga?

Sempre aconselhei os homens a controlarem-se nos actos, mas não nas fantasias. Tinha um leitor que fantasiava acerca de arrancar os dedos dos pés das mulheres à dentada. Eu respondia, "se essa fantasia o satisfaz, óptimo. Mas não há nenhuma mulher que goste que lhe arranquem os dedos dos pés". Eles respondiam, "claro que não, isto é o mundo da fantasia". Não se deve julgar as fantasias.

A pornografia tem mais a ver com fantasia ou realidade?


O consumidor médio está na casa dos 40 anos, é casado, tem filhos e usa a pornografia como um escape. Em vez de ter um caso, está a ter fantasias, a olhar para pornografia e a masturbar-se. O que, se me perguntarem a mim ou a outra mulher casada, me parece a melhor alternativa.

Mudando de assunto, é verdade que o seu hobbie é a taxidermia?

[Ri-se] É verdade. Tenho muitos exemplares. Começou na infância. Sempre gostei muito de animais e vivi em casas onde havia grande contacto com a natureza. A minha tia favorita tinha um namorado que estava a estudar taxidermia. Com sete anos tinha um pato embalsamado...

Em vez de um urso de peluche?

Sim! Eu dormia com ele e adorava-o. Quando me tornei independente, comecei a coleccioná-los e a aprender a fazê-lo. Tenho um jacaré que cumprimenta as pessoas que entram em minha casa, um ornitorrinco... Alguns são da era vitoriana. Na altura não eram espécies ameaçadas.

Estão espalhados pela sua casa?

Quando vivia em Nova Iorque, sim. Mas quando nos mudámos para Los Angeles, o meu marido reclamou, "estou farto de viver rodeado de todos estes animais embalsamados!" Estão todos no meu escritório de casa, menos o jacaré.

Desculpe estar a rir, mas...

Ria-se à vontade, toda a gente de ri. Não me importo de ser objecto de ridículo.

Tem interesses muito invulgares.


Vou só dizer isto: é porque eu era uma criança pouco popular e passava muito tempo sozinha e desenvolvi uma personalidade com pouco interferência dos meus pares e dos meus pais. Daí não controlar os meus interesses.

É mais pura.

Sim, sim. A maior parte das pessoas só são assim no início da infância ou no fim da vida. Eu permaneci sempre assim.

Em que está a trabalhar agora?

Comecei o último livro desta série: "The big book of pussy". Espero que venda muito, muito, bem.


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